Em 2016, cessei, por vontade própria, de ministrar aulas regulares de direito comparado na PUC-Rio, depois de 40 anos de magistério ininterrupto nessa grande instituição, na qual me formei. Há muito, tinha o projeto de escrever um livro sobre a longa experiência de ensino de uma única cadeira, o direito comparado, cujo estudo me atraiu fortemente e me motivou a buscar o magistério superior. Iniciei a sua confecção, mas depois que me retirei das aulas, invadiram-me um certo torpor e perigoso desânimo. O tempo foi passando velozmente. Não tenho a invejável disciplina de alguns amigos meus que levam a cabo, com tenacidade e sem tardar, os seus projetos. Contudo, há pouco tempo, li na Folhinha do Sagrado Coração de Jesus (Editora Vozes), uma frase de Steve Jobs, o criador da Apple, frase que me mobilizou, não obstante a minha condição de septuagenária: cada sonho que você deixa para trás é um pedaço do seu futuro que deixa de existir”. E, em pleno periodo pandêmico, me deparei com uma outra frase não menos instigante, de Miguel de Unamuno: sonhar não é esperar. Voltei, pois, ao entusiasmo inicial de discorrer sobre minha experiência, em grande parte, motivada pela tentativa de acentuar o legado que recebi de muitos comparatistas, em aulas, por leituras e pelo convívio. Na confecção do presente texto, tomei a liberdade de fazer remissão a alguns artigos meus, trazendo-os à colação neste quadro mais amplo de estudo. Retomei, então, o trabalho e percebi, desde logo, que o período de estagnação não fora, de todo, improdutivo. Ele me propiciou, por um lado, nuançar certos posicionamentos quanto ao papel contemporâneo do direito comparado e, de outro, fortalecer o meu entendimento relativamente aos efeitos negativos de alguns fenômenos no campo cultural, tais como a rapidez e a superficialidade de determinados escritos no domínio da comparação jurídica, e, sobretudo, o descarte, lamentável, de obras valiosas para o direito comparado, sob o pretexto de que pouco representam para as pesquisas atuais. Permito-me acentuar também que, no imenso prazer com que estou escrevendo este texto, dei-me ao luxo de me afastar da obrigatoriedade de exaurir referências bibliográficas fundamentais ou de percorrer caminhos academicamente habituais, sem, contudo, chegar às raias do academicamente incorreto. Encaro este processo de escrevê-lo como um passeio, através do qual vão sendo redescobertas muitas paisagens que admirei e que fico feliz em rever e compartilhar. Agradeço a Deus poder fazê-lo nesta fase avançada da vida, com todas as lacunas previsíveis. Busquei destacar ensinamentos que mais me calaram nessa longeva experiência de ensino do direito comparado e autores que nortearam muitas das minhas reflexões.
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