Descrição
“Guarda pra mim” revela toda a inquietude de um poeta com seu universo histórico, cultural e afetivo. A estética de cada poema valoriza as palavras em sua amplitude e significados. Faz-nos bem. É como acordar em um dia de domingo, na primavera, e encontrar sobre a mesa do café um buquê de rosas amarelas.
Mergulhar no universo poético de Semog é como mergulhar no oceano profundo da alma a procura das certezas e das incertezas que nos envolvem. Não basta ter o DNA do sofrimento ancestral ou a batida de um coração como um surdo de primeira sem resposta, a realidade é que Semog traduziu na poesia aquilo que poucos conseguem, “A Blue Note Poética”, ali aonde poucos chegaram.
A poética semoguiana surfa nas ondas fortes da filosofia, do amor, do tempo e do povo. Cada onda no seu tempo, trazendo toda sensibilidade e a vivência de um poeta que sabe distinguir as pedras das ruas, das pedras da fila*.
Semog faz da poesia a sua ferramenta de comunicação com o interior das pessoas, nos leva a reflexão desse nosso cotidiano impregnado de meias palavras de faces e selfs. Através da palavra escrita plena Semog nos traz revelações e expressões do seu pensamento na sua construção literária.
Conheci Semog no início dos anos de 1980 junto com outro poeta José Carlos Limeira, foi em um encontro do Movimento Negro/RJ, de repente, do nada, começaram a dizer poesias mostrando aos demais militantes que a poesia é um instrumento importante na nossa luta. Foi um choque porque àquela época era ditadura, estávamos todos preparados para enfrentá-la no embate, e Semog nos mostrou que a poesia era necessária. O poder da palavra escrita e dita é muito forte. O poeta se impõe quebrando o silêncio dos nossos temores e revelando a verdade que não enxergamos. O processo cognitivo de sua criação revela o perfil desse poeta, às vezes é ácido como um limão tirado do pé: “Um furacão passou em mim e me levou, nada de mim restou do que de mim ficou.”
E simples como o voo de uma garça: “Meu endereço não é um envelope de carta. Meu lar não quer sê-lo.”
Depois que li todos esses poemas escritos por Semog tive a compreensão do título. Vou guardar.
*Na Lapa/RJ um grupo de voluntários faz um atendimento social a noite para as pessoas que moram na rua. Durante a tarde os sem-teto começam a garantir seu lugar na fila, vai se colocando uma pedra atrás da outra, um pedaço de madeira, uma lata ou um jornal velho dobrado marcando território, e voltam mais tarde. Todos respeitam as demarcações.
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