Descrição
Feminismos, identidades, comparativismos: vertentes nas literaturas de língua inglesa chega ao seu décimo primeiro volume – motivo, sem dúvida, de comemoração, para nós, professoras pesquisadoras do Mestrado em Literaturas de Língua Inglesa do Programa de Pós-graduação em Letras da UERJ. Celebrando a continuidade e a longevidade do projeto, convidamos, este ano, a colaborar no livro, duas articulistas externas, cujos trabalhos dialogam com nossas duas linhas de pesquisa. A linha A voz e o olhar do Outro: questões de gênero e/ou etnia nas literaturas de língua inglesa trouxe a Professora Adelaine La Guardia, da Universidade Federal de São João del-Rei, que realiza pesquisas nas áreas de teoria crítica feminista, literatura de mulheres, gênero e sexualidade; e a linha de pesquisa Literatura e Comparativismo convidou a Professora Vivien Kogut Lessa de Sá, da PUC-Rio e da Universidade de Essex, cuja pesquisa concentra-se atualmente na área de literatura inglesa do Renascimento.
É Adelaine La Guardia quem assina o ensaio de abertura do volume, “Um jeito queer de (não) ser: a escrita autobiográfica em Nina Here nor There, de Nick Krieger”, no qual discute, à luz das teorias da autobiografia e da perspectiva queer, um texto produzido segundo um novo paradigma “pós-transsexual”. Partindo desse texto autobiográfico de Krieger, a pesquisadora investiga como o sujeito autobiográfico lida com as convenções, sistemas e instituições que produzem identidades viáveis e inviáveis, forjando, primariamente através da escrita do corpo, modos de existência queer alternativos.
Ana Lucia de Souza Henriques dá continuidade à discussão iniciada em seu texto anterior, “Considerações acerca da literatura brasileira em Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho, de Richard Burton”, com “Poetas árcades e Inconfidência Mineira sob a ótica de Richard Burton”. Neste segundo momento, aborda anotações do capitão Burton acerca dos homens de letras brasileiros – tomadas como contribuições para os estudos da escrita da crítica e da história da literatura brasileira–, destacando aquelas notas a respeito de poetas árcades cujas vidas estão marcadas pela Inconfidência Mineira.
Revisitando o clássico The Catcher in the Rye, Eliane Borges Berutti sublinha em “J. D. Salinger: uma voz dissidente dos anos
1950” a denúncia contra a sociedade norte-americana do pós-guerra feita por um adolescente. Focalizando o protagonista/narrador Holden Caulfield como um porta-voz dos jovens rebeldes de sua época, o artigo examina em que medida o conformismo social, a afluência econômica, o consumismo e a mediocridade reinantes naquela década deram origem à insatisfação daqueles jovens norte-americanos.
“Retratos de Shakespeare na ficção brasileira contemporânea” integra a pesquisa de Fernanda Teixeira de Medeiros sobre obras da ficção brasileira recente que dialogam com o universo shakespeariano.
Os três romances comentados no artigo, O mistério do leão rampante (1995), O fazedor de velhos (2008) e Essa maldita farinha (1987), os dois primeiros de Rodrigo Lacerda, e o último de Rubens Figueiredo, produzem, cada um, uma certa imagem do poeta e dramaturgo inglês.
Embora bastante diferentes entre si, os retratos guardam em comum a presença de contradições e ambivalências, como se só fosse possível pintar Shakespeare com cores e elementos contrastantes.
Em “Práticas autobiográficas: a abordagem de experiências-limite nas literaturas contemporâneas de expressão inglesa”, Leila Assumpção Harris discute, a partir da produção literária de escritoras pós coloniais da última década do século XX e da primeira do século XXI, as práticas autobiográficas adotadas pelas escritoras migrantes de expressão inglesa, considerando a fluidez das fronteiras entre autobiografia e ficção, as conexões entre a consciência diaspórica e a expressão literária, o entrelaçamento do pessoal com o coletivo e o papel da literatura na abordagem de experiências-limite. As obras em foco são The True History of Paradise (1999), de Margaret Cezair Thompson; The Autobiography of my Mother (1996), de Jamaica
Kincaid; e Purple Hibiscus (2003), de Chimamanda Ngozi Adichie.
O romance da escritora canadense Margaret Atwood, The Handmaid’s Tale (1985), é o objeto de discussão de Lucia de la
Rocque em “The Handmaid´s Tale, de Margaret Atwood: os novos caminhos do uso da fertilidade humana e os diferentes papéis de seus atores sociais”. O artigo se desenvolve com base na discussão do romance à luz de três ensaios do campo da Antropologia, e defende a noção de que essa distopia, embora possa ser descrita como sendo de ficção científica, é sem dúvida precursora, pois, ao mesmo tempo em que imagina uma sociedade em que a figura da mãe de aluguel se institucionaliza, aponta para os novos caminhos do uso da fertilidade humana e os diferentes papéis de seus atores sociais.
No ensaio “Repensando o tema do exílio e do corpo ressonante: reflexões em torno de Quicksand, de Nella Larsen”, Maria Aparecida Andrade Salgueiro percorre a obra Quicksand com foco na trajetória da protagonista Helga Crane, que se desloca em espaços geográficos e afetivos, em leituras que ecoam ressonâncias de que seu corpo é permeado e que seu corpo permeia. O texto incorpora ainda leitura recente sobre o exílio e os deslocamentos forçados, a partir de escritos de autores da Europa Oriental, tais como Galin Tihanov (2011; 2013).
O filme A bela da tarde (1967), de Luis Buñuel, e o conto “Secret” (1994), de Ivy Goodman, são os dispositivos para uma
reflexão sobre o “duplo” em “Cenas de sonhos e fantasias: o duplo e o erótico”, de Maria Conceição Monteiro. Tomando emprestado de Barthes a expressão “terceiro significado”, que configura o que o autor caracteriza como “significação obtusa”, a ensaísta enfatiza a dimensão semântica que o duplo incorpora, ao exceder a mera cópia do referente, para tornar-se uma compreensão poética que se projeta para além da cultura consensual.
A investigação sobre as possibilidades e diversidade do gênero autobiográfico produzido por escritoras étnicas contemporâneas é o mote de “Empoderamento do sujeito feminino indígena em Storyteller e The Turquoise Ledge: A Memoir, de Leslie Marmon Silko”, de Peonia Viana Guedes. O ensaio demonstra como ambas as obras de Silko, contando histórias diferentes e usando modos de narrar diferentes, comprovam a importância da narrativa na formação da identidade
pessoal e cultural de indivíduos e comunidades indígenas.
Concluindo o volume, o texto “O manuscrito roubado e o poeta elisabetano: encontros no Brasil do século dezesseis”, de Vivien Kogut Lessa de Sá, acompanha a trajetória aventuresca de um manuscrito brasileiro atualmente guardado na Biblioteca Bodleian, na Inglaterra.
Analisando os detalhes dessa história e seus personagens principais – os jesuítas que produziam doutrinas cristãs para servir na catequese dos índios brasileiros e o poeta e dramaturgo inglês Thomas Lodge, que roubou o manuscrito durante um ataque corsário a Santos, em 1591 –, o trabalho investiga os resultados deste inusitado encontro cultural entre a Inglaterra elisabetana e o Brasil-colônia.
Esperamos que leitores e leitoras deste livro desfrutem da diversidade de seus dez ensaios e contactem, simultaneamente,
alguns de seus interesses recorrentes. Os feminismos, identidades e comparativismos a que o título da coletânea alude não se pretendem exaustivos na construção de um panorama do estudo das literaturas de expressão inglesa no presente, mas representam, em contrapartida, uma espécie de ponte entre línguas, culturas, literaturas e tempos históricos distintos; assim como entre o Maracanã e o Canadá; entre o Rio e Essex; entre Minas e Estados Unidos. Contando sempre com o apoio e o incentivo da Coordenação do Programa de Pós-graduação em Letras da UERJ, acreditamos que essas pontes possam seguir
sendo construídas, por muitos volumes a vir.
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